quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Tempos de agito

         
Jornal A Cidade - Ribeirão Preto, SP - 11/11/2013
Crédito: Thomate


          Era uma vez um lugar muito, mas muito inóspito. Uma cidade. Parecia cenário de faroeste. Ali, poucas coisas aconteciam. Quer dizer, aconteciam muitas coisas (problemas com distribuição de água e tratamento de esgoto, vereadores que achavam que o município era uma extensão do quintal de casa, prefeita com várias suspeitas, enfim, com vários problemas), porém, a imprensa não cobria com afinco para não criar alarde ou por rabo preso mesmo.

          Por ter noticiários monótonos, recheados de buracos, apreensão de pequenas quantidades de drogas e detenção de trombadinhas, tudo parecia calmo. Nada que fosse digno de Jornal Nacional.

          Mas é aquela história: jornalista está seco para cobrir grandes eventos, seja Copa do Mundo, Olimpíadas, Conclave e atentado terrorista. Apareceu uma brecha, então não pode desperdiçar. A brecha foi a falta do menino Joaquim.

          O garoto desapareceu durante a madrugada, e no mesmo dia as redes sociais estavam repletas de compartilhamentos sobre o fato, inclusive na página de artistas famosos. Não demorou muito que as suspeitas sobre culpados começarem, e o perfil do padrasto (ex-dependente químico) do menino chamou a atenção.

          Isso foi o necessário para que programas policialescos, aqueles do horário do almoço ou do fim da tarde, que com esforço podem te sujar de sangue, iniciassem uma busca por um culpado, corpo e causa da morte. A charge do Jornal A Cidade, do dia 11/11, retratou isso muito bem. Eram verdadeiros vampiros.

          Eram pixels e mais pixels, horas e mais horas, IBOPEs crescendo e mais IBOPEs crescendo. Tudo rendendo frutos. Até que o corpo foi achado, e houve uma corrida até a porta da delegacia da cidade. Links e repórteres de plantão. Muitos que poderiam estar em um momento de tensão comemoravam a primeira grande cobertura. Fotos nas redes sociais ilustravam um clima de festa.

          Em 2012, a cidade de São Paulo registrou 1495 homicídios. De janeiro a setembro deste ano, foram mais de 15 mil desaparecidos no estado bandeirante. São meninos e meninas, adolescentes, adultos, deficientes físicos e mentais e idosos que não receberam nem uma nota de rodapé.

          Se o caso do menino Joaquim fosse para levantar uma bandeira contra a violência, toda a exploração que o caso vem recebendo seria muito bem-vinda, mas é apenas um que chamou atenção. Os motivos e teorias disso são diversos, mas não saem do “talvez”. O final todos sabem. O julgamento demorará anos para acontecer, as pessoas esquecerão, os repórteres farão outras coberturas e a cidade continuará inóspita.

Leonardo Oliveira dos Santos
Estudante de Jornalismo
Ribeirão Preto/SP

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