segunda-feira, 7 de maio de 2012

Jornalismo esportivo não é palhaçada


Guernica, de Pablo Picasso


          As emissoras de televisão da nossa região, EPTV, TV Clube, Record... desrespeitam o povo, principalmente os amantes do futebol, quando tratam esse esporte como entretenimento, quando falam apenas o resultado das partidas. Futebol é expressão cultural, não é briga, não é qualquer brincadeira.

          Copiar o estilo de apresentação do Globo Esporte SP, apresentado por Tiago Leifert, é um tapa no rosto de botafoguenses, comercialinos, sertanezinos, jaboticabalenses, etc. Tal apresentador teve sua visão de jornalismo esportivo moldada nos Estados Unidos, onde tudo é motivo para show e ganhar dinheiro. Quem conhece nossas praças esportivas sabe que a realidade é diferente.

          Então, vão falar: “Ah, mas no resto do mundo também é igual!”. Não, não é igual. Na Argentina, o Boca Juniors representa os habitantes de um bairro portuário de Buenos Aires, tanto que suas cores são amarelo e azul, pois seus fundadores falaram que iam adotar as cores da bandeira do primeiro navio que atracasse no cais, no caso uma embarcação sueca. Seus torcedores são conhecidos como “Los Bosteros”, porque seu estádio, La Bombonera, foi construído sobre um lugar onde era costume jogar os excrementos dos animais. O maior rival do Boca Juniors, o River Plate, é conhecido como “Millionarios”, porque, na época da sua fundação, representava a grande elite da capital argentina.

          Um dos mais acirrados clássicos do planeta, Celtic contra Rangers, ambos escoceses, não representa apenas dois times, mas, sim, duas ideologias. Quem torce pelo Celtic é católico e defende a independência de seu país ante o Reino Unido. Já torcedores do Rangers são protestantes anglicanos e preferem permanecer na Commonweath.

          Na Espanha, é de praxe dizer que o Barcelona é a cara da Catalunha. Isso porque durante o período da ditadura de Franco, entre as décadas de 1930 e 1970, o clube traduziu no esporte a sua oposição ao regime, ao contrário do Espanyol, que, durante o período, chamava-se Espanhol, em apoio ao ditador. Essa época foi a mesma em que o Real Madrid cresceu, pois era a equipe preferida do general. Ainda na península Ibérica, há o Athletic Bilbao, o clube identidade do País Basco, onde fica a cidade de Guernica, destruída pela ditadura franquista e depois foi retratada por Pablo Picasso em uma de suas obras mais célebres. A instituição só aceita atletas bascos, pois acredita representar a região. Pode parecer xenofobia, mas não é. É expressão cultural.

          No Brasil, temos também um exemplo grandioso, Grêmio e Internacional. O colorado foi fundado por italianos, que não eram aceitos no Tricolor, pelo fato de o Grêmio, na ocasião, só aceitar alemães. Não é à toa que a mascote do Inter é o saci, esse personagem tão brasileiro, para mostrar que qualquer um poderia ser aceito. O escritor Luís Fernando Veríssimo é colorado porque cresceu durante a Segunda Guerra Mundial. E, como o Grêmio era o clube dos alemães, preferiu o Inter.

          Quem assistiu ao filme “Boleiros”, de Ugo Giorgetti, sentiu o gostinho do que o futebol significa para os paulistanos. Aliás, um dos motivos de eu querer ser jornalista é a cena da repórter no hall do hotel que o Palmeiras estaria hospedado, na manhã do clássico com o Corinthians, para conseguir entrevistas com os atletas.

          É emocionante descer do Ônibus na rua Clélia, com o trafego parado, e ir caminhando até a Rua Turiassu. Isso parando antes em barraca de pernil, entrar no Palestra Itália e passear por suas alamedas antes dos jogos. Imagino que um corintiano sente o mesmo se reunindo com outros torcedores na Praça Charles Muller, um santista saindo da praia e indo para a Vila Belmiro e um são-paulino na Avenida Giovane Gronchi, pertinho do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo do Estado de São Paulo. Quantas histórias não têm aí?

          O repórter Mendel Bydlowiski, da ESPN Brasil, que já cobriu Copa do Mundo, fez uma matéria que é uma verdadeira obra prima, inclusive elogiada pelo diretor de jornalismo da emissora, José Trajano, sobre a partida Juventus e Guaçuano, válida pelo Campeonato Paulista da Série A3. Ver essa reportagem vale muito a pena para nós, estudantes de jornalismo. Eu quero ver coisas assim envolvendo Botafogo, Comercial, Sertãozinho...

          Futebol entretenimento foi algo inventado pelos europeus para vender a marca de seus clubes na Ásia, principalmente na China, Coreia do Sul e Japão, onde seus adolescentes reverenciam hologramas como artistas.


Outro texto que aborda o mesmo tema:
http://vigilantesdanoticia.blogspot.com.br/2012/04/ate-quando.html

Leonardo Oliveira dos Santos
Estudante de Jornalismo
Ribeirão Preto/SP

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